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O COIÓ


garotinho tolo

          Coió, é uma palavrinha espirituosa; parece gíria, mas existe de fato.  Alguns dicionários a registram com o significado de menino tolo. Vou contar uma estória lá da minha cidade, da minha saudosa e e bela Passa Quatro-MG.


          ... Era uma vez um menino.  Seu nome era Luiz.  Não se lhe conhecia o sobrenome, pois todos o chamavam apenas de  LUIZ.  Ele não tinha nem mesmo um apelido, como era comum a tantas outras crianças da sua idade.

           Luiz tinha 10 ou 11 anos, e possuía alguns traços marcantes: cabeça grande, sobrancelhas negras e espessas emendadas uma à outra sob a testa;  uma expressão jocosamente caipira.  Parece que fora caracterizado ou produzido para participar daqueles folguedos juninos.  Mas não, estas eram suas feições naturais, e não obstante, a sagacidade e as brincadeiras das outras crianças, lhe pouparam o desconforto de uma alcunha injuriosa.

          Na bucólica cidadezinha onde morávamos, um rio separava a cidade do campo.  Era o rio Passa Quatro.  A cidade crescera ocupando a margem esquerda do rio, e na margem direita, via-se apenas alguns casebres, e os terrenos de uma fazenda.

          Margeando o rio, havia também uma estreita estrada de terra.  O Luiz\ morava no campo, num daqueles casebres que formavam a paisagem.  Bastava-lhe atravessar uma ponte de madeira sobre o rio divisório, caminhar uns cem metros, e já estava na cidade.  Esse trajeto, não demorava mais que 10 minutos de sua costumeira caminhada.

          Aos domingos, eu costumava passar boa parte do dia, pescando à beira daquele rio.  Era um rio pequeno, de corredeiras rasas, mas embaixo daquela ponte, formava um volume d'água, semelhante a uma lagoa, que a gente chamava de poço fundo.  O local era ótimo para uma pescaria, e o rio era rico em pequenos peixes.

          O Luiz, sem ter algo para fazer objetivamente, também passava boa parte do dia como "barata tonta", ou seja, atravessando a ponte sobre o rio, de um lado para outro, no trajeto de sua casa para a cidade, e vice-versa:
          - Aonde você vai, Luiz?
          - Vou para a cidade.
          - Fazer o que?
          - Nada...
          - Ôoh, Luiz! Aonde você vai?
          - Vou para casa.
          - Fazer o que?
          - Nada...

          Do sossego da minha pescaria, eu observava o garoto;  me parecia sem nexo suas idas e vindas, de lá prá cá,  de cá prá lá... e para nada?... (?) - Podia-se repetir mil vezes aquelas perguntas, que as respostas do garoto eram invariavelmente as mesmas.

          E cada vez que o Luiz passava por ali, cruzando a ponte, ele também fazia suas perguntas sempre repetitivas:
          - Pegou "ARGUM?" (Ele queria saber se eu havia fisgado alguns peixes).
          - Sim... (eu respondia).
          - "Deixa eu ver?" (Eu lhe mostrava uma fieira de peixes, e ele se dava por satisfeito);
          - AAHH !...

          Na ida para a cidade, ou de volta para sua casa, naquele vai e vem, o Luiz queria saber: "pegou argum?";  "deixa eu ver?"...
Certa vez, acho que eu não estava muito bem humorado, e antes que ele me perguntasse, "pegou argum?", fui logo respondendo:
          - "Argum" não peguei não, ôoh, Chico Bento, peguei foi lambari, mandi, timburê...
          - "Deixa eu ver?"
          - A cobra comeu...
          - AAHH !...

           O garoto era tão chato e tolo, que até esta estória ficou parecida com ele; assim, meio coió, sei lá...

       



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